domingo, 29 de setembro de 2019

Os garotos no Bar Luiz


I
nício da década de 70, fase da descoberta dos bares e barzinhos. Época de muitas mudanças. Dos festivais de rock, do amor livre e do avanço das drogas. Minha turma, acho que foi privilegiada, pois apesar das ofertas constantes de drogas, principalmente da marijuana, cada vez mais comum, a grande maioria ficou no sabor dos drinks, e claro que as preferências eram, e continuam até hoje, por um chopp bem tirado e uma cervejinha bem gelada.
Os barzinhos da Montenegro competiam com outros mais tradicionais. Lamas, no Catete, e o Bar Luiz, no Centro, eram dois dos mais lembrados, e não podiam faltar na nossa relação.


Fica difícil lembrar quando foi a primeira vez que estivemos no Bar Luiz. Se foi com o pessoal da Faculdade, da minha turma de rua, com o pessoal de onde estagiava, enfim, de qualquer lugar partia um convite para conhecer o “melhor chopp do Rio” e sua “comida alemã”.
Ziraldo, Jaguar, Sérgio Cabral (pai), e muitas outras figuras de destaque, eram frequentadores assíduos, mas para nós, não eram mais importantes que meu pai, Byrão, já falecido, e Dr. Ari, que prestes a fazer 90 anos de idade, continua firme e junto com a gente em mais essa visita, para mais um chopinho.
Duas semanas atrás veio a notícia que o Bar Luiz iria fechar. Foi um corre-corre danado.  Só eu recebi uns três convites para “visitar antes que feche”. Mas o que parecia o fim, acho que foi um renascer. Até penso que pode ter sido uma jogada de marketing, e se foi, parabéns, foi muito boa, e tudo indica que deu certo.
O Bar voltou a virar notícia, e suas mesas lotaram. Ontem, dia 27 de setembro, ao meio dia não tinha um lugar disponível, e era possível ver uma incrível diversidade, de pessoas, de idades, de sexo, de tudo. O Bar Luiz estava novamente em alta. E esperamos que continue assim ainda por muito tempo.
Para os que não conhecem sua história, nosso Dr. Ari estufa o peito para dizer que pela sua frequência, sempre no fim das tardes de todas as quintas-feiras, durante anos e anos, foi um dos privilegiados com o convite para os “CEM ANOS DO BAR LUIZ”.
Para quem não sabe, é considerado o bar mais antigo do Rio de Janeiro e começou sua história em janeiro de 1887, na Rua da Assembléia. Aberto por um alemão, Jacob Wendling, teve como primeiro nome Zum Schlauch, que pode ser traduzido com “A Mangueira”, em referência  à mangueira (serpentina) que ficava imersa num recipiente com gelo, por onde o chopp circulava. Era a primeira chopeira no Brasil.
O Bar Luiz mudou algumas vezes de nome e de endereço. Passou a se chamar Zum Alten Jacob (“Ao Velho Jacob”), em homenagem ao seu fundador. Depois, em 1915, passa a se chamar Bar Adolph, nome de seu dono na época.
Muda para a Rua da Carioca, 39, em 1927, onde permanece até os dias de hoje. No entanto, em 1942, na época da Segunda Grande Guerra, recebeu diversas ameaças, pois muitos entendiam que o bar, de estilo alemão, fazia uma referência ao nazista Adolf Hitler. Apesar da defesa de diversos clientes, muitos tradicionais, de um bar que naquela época já contava com mais de 50 anos, seu proprietário, um alemão de nome Ludwig (Luiz, como ele se apresentava), e optou por trocar o nome para Bar Luiz.
Hoje, nossa mesa formada com Dr. Ari, 89, Raimundinho, 78, Osires, 72, Dellaney, 66, e eu, Zé Drinks, 65, o mais novo dos velhos garotos, mantivemos a tradição de outros encontros, e mais uma vez provamos do melhor chopp do Rio e degustamos uma caprichada salsicha alemã, e para nossa alegria, numa mesa ao nosso lado, um grupo de jovens, estudantes, na faixa dos vinte e poucos anos, todos festejando com um copinho gelado, sempre bem tirado, o que nos deixa a certeza de que nós passaremos, mas a serpentina do Bar Luiz ainda irá gelar muito chopp na nossa cidade maravilhosa.
 
Só esperamos que a política, cujos diversos representantes tanto festejaram em suas mesas, e que até premiou o Bar Luiz, e outros 10 barzinhos espalhados na cidade, com a inclusão no Cadastro dos Bares Tradicionais, que lhes conferiram status de Patrimônios Culturais da Cidade, não seja a responsável, ou irresponsável, pelo aumento no abandono que ainda persiste na área de seu entorno, que necessita de uma política mais agressiva de preservação e atividades culturais. Os garotos do Bar Luiz agradecem.