quinta-feira, 13 de agosto de 2009

A força da intolerância

Saí de casa, já um pouco atrasado para o trabalho e notei que um pneu estava furado. Sem alternativas, após o resmungo natural, fui pegar o estepe e para surpresa, estava vazio. Como me considero um cara tolerante e calmo, fechei o carro e resolvi pegar um ônibus. Andei meus três quarteirões e após a “normal” espera, em torno de 40 minutos naquele dia, chegou o “buzão”, cheio, claro. Como o tempo corria, entrei e fui enfrentar a viagem Niterói - Rio de Janeiro, em pé e pela Ponte Rio-Niterói, que é sempre uma incógnita para nós. Manhã bonita, dia de sol quente, e a orla cheia de “vagabundos” passeando, correndo, fazendo ginástica, e eu, em pé, dentro de um ônibus apertado, e na direção de um trajeto que na maioria das vezes atrasa para chegar. Entrei na Ponte exatamente uma hora depois que tinha constatado o pneu furado e pensava com meus botões: - tudo bem, nada de intolerância, uma hora a mais ou a menos não vai me prejudic....a..r... caraca! que houve? Nada demais, apenas uma puta freada do motorista que acabou por derrubar um motoqueiro, que tinha resolvido passar na sua frente pelo “ponto morto”, na direita da pista. Não deu outra, o transito parou na hora. Todos queriam ver o que tinha acontecido, tanto nas pistas de ida quanto nas de volta. E nesse momento já questionava minha calma e tolerância. Na verdade, em poucos minutos a ambiente era de caos. Confesso que não sabia o quanto as pessoas estavam tão intolerantes. Um grupo defendia o rapaz da motocicleta, outros o motorista, e a maioria reclamava que estava atrasado para o trabalho. Eu não tinha visto o lance e não sabia dizer quem era o culpado, mas com certeza estava atrasado e já torcia para que tudo se contornasse. Pelo que foi possível notar, ninguém estava machucado, mas a moto estava com uns arranhões e o rapaz, meio abusado, e ao perceber que alguns passageiros o defendia, começou a gesticular e discutir com o motorista, que já se preparava para partir. Ameaçando-o e exigindo uma indenização pelos arranhões em sua moto, o rapaz ficava cada vez mais exaltado, enquanto o motorista, no limite de sua tolerância, discutia com os passageiros para tentar provar que não era o culpado. Alguém do meu lado tomou as dores do motorista e achou um absurdo a atitude do rapaz. Chamou-o de imbecil e que estava querendo se aproveitar de uma situação criada por ele mesmo e exigia que o motorista seguisse viagem e, se necessário, seria sua testemunha em qualquer ação. Ao perceber que aquele pequeno acidente já tomava outras proporções, peguei o telefone para avisar de minha demora e aproveitei para jogar um pouco de SUDOKU para relaxar, e torcia para que um outro ônibus daquela linha parasse ali para nos levar. Por sorte nossa, um grupo de passageiros, mais determinados e com elogios tanto para o motorista quanto ao próprio motoclicista, conseguiu acalmar os ânimos e convenceu, antes mesmo da polícia chegar, que não valia a pena continuar com aquela discussão. O rapaz foi embora e nós seguimos em frente. Foi interessante constatar que aqueles senhores conseguiram superar a intolerância daquele momento com elogios e ações positivas, não muito comum nos dias de hoje, onde é possível perceber que as pessoas estão realmente mais intolerantes e se preocupam muito mais com os defeitos de terceiros do que com as próprias virtudes. E pelas manchetes nas revistas e jornais, é possível constatar que quanto maior o nível da pessoa, mais fácil se verifica tal situação. Tudo indica que nas pessoas mais humildes, a tolerância ainda é uma virtude bem mais conservada. E por que será? Envolto com os pensamentos, cheguei a cochilar em pé, quando de repente o ônibus para num sinal e é anunciado um assalto. “Meu dia de cão”, pensei com meus botões. Mas o susto foi maior do que a ação, pois eram dois rapazes novos, inexperientes, e de tão nervosos foram surpreendidos por passageiros e atirados para fora do ônibus aos empurrões e cacetadas. Já na rua, a Polícia, que passava por perto, parou e prendeu os meninos antes de maiores conseqüências. Um dos policiais entrou no ônibus e convidou a todos para irem na Delegacia prestar queixas e depoimentos. Acabou minha viagem naquele ônibus. Como nada tinha visto e não fui roubado, optei por rapidamente sair da confusão e seguir para o trabalho. Com mais de duas horas de atraso, fui recebido pelo chefe com a cara amarrada e questionando se o problema na ponte tinha sido muito grande. Era nítida a força de sua intolerância. Na realidade, ele é da linha que se preocupa muito mais com as falhas dos empregados do que em elogiar o que é bem feito. Hoje em dia, percebemos que cada vez está mais fácil um colega valorizar o seu trabalho do que os chefes reconhecerem a qualidade de seus subalternos. E por incrível que pareça, é um mal que avança para os lares, onde a intolerância é observada entre o homem e a mulher, entre pais e filhos, e claro, a mais famosa, entre irmãos de qualquer idade. O resultado é a busca na informalidade dos amigos ou então em psicólogos, que cada um na sua maneira, tentará quebrar essa força, que poderia ser combatida da mesma forma que os passageiros do ônibus agiram como o motorista e o motociclista, ou seja, com diálogo e elogios, de um para o outro e viceversa. É uma receita simples de vovó. Dê bom dia ao acordar. Elogie os cabelos desarrumados de sua esposa. Diga a seu marido que ele está com um aspecto bonito. Que a nota baixa de seu filho é apenas um acidente e que ele é capaz de melhorar e muito. Que sua amante está linda, opa, acho que exagerei. E antes que se perca a tolerância para ler até o final do texto, não se afaste nunca do amor e pratique o perdão. Perdoe hoje, aquele que ontem você achava impossível de perdoar e com certeza esse será seu maior exercício contra a crescente força da intolerância. Nós, por natureza, não vivemos e não devemos viver isolados. A solidão é a exceção na sociedade, por isso brindemos aos amigos, ao companheirismos na família, à motivação gerada pelo reconhecimento de nossos atos, pelos elogios verdadeiros e acima de tudo, pela tolerância mútua, pois sem ela, os demais atos tendem a rarear cada vez mais.

2 comentários:

Byra disse...

Presidente,

bem opotuna a abordagem do tema. Não estou querendo ser intolerante, mas.... ONDE ANDAM OS CONFRADES E CONFREIRAS????? VAMOS PARTICIPAR, PORRA!!!! SE NÃO PODE SER 'AO VIVO' ESCREVAM, MANDEM NOTÍCIAS E SINAL DE VIDA, AFINAL ESTOU COM SAUDADES DE VOCES, PORRA!!!

Com o carinho de sempre....

Alexandre Lima disse...

Prezado Amigo Zé,

Muito legal , rico em ensinamentos. Em particular: " (...) nos dias de hoje, onde é possível perceber que as pessoas estão realmente mais intolerantes e se preocupam muito mais com os defeitos de terceiros do que com as próprias virtudes. E pelas marchetes nas revistas e jornais, é possível constatar que quanto maior o nível da pessoa, mais fácil se verifica tal situação. Tudo indica que nas pessoas mais humildes, a tolerância ainda é uma virtude bem mais conservada.(..). Hoje em dia, percebemos que cada vez está mais fácil um colega valorizar o seu trabalho do que os chefes reconhecerem a qualidade de seus subalternos.(..)O resultado é a busca na informalidade dos amigos ou então em psicólogos, que cada um na sua maneira, tentarão quebrar essa força,

Cabe algumas citações de ordem lógico-folosófico de forma a enriquecer, ainda mais ,este texto brilhante.

Um abraço.

Alexandre Andrade Lima - Assessor Comercial SR
Gerência de Vendas a Consumidores do Rio de Janeiro
Petrobras Distribuidora S.A.